Por Giancarlo Barbosa
O Tribunal Superior Eleitoral julgou em data de 21 de maio de 2024, em Turma composta pelos os Ministros Alexandre de Moraes, Cármen Lúcia, Nunes Marques, Raul Araújo, Isabel Gallotti, Floriano de Azevedo Marques e André Ramos Tavares, o caso do Senador Sérgio Fernando Moro (União Brasil-PR).
Na sessão foram julgados dois recursos ordinários (RO-El nº 0604176-51.2022.6.16.0000 e RO-El nº 0604298-64.2022.6.16.0000), interpostos pela Federação Brasil da Esperança (PT, PCdoB e PV) e pelo Partido Liberal (PL) e teve como Relator o Min. Floriano de Azevedo Marques e Vice-Procurador-Geral Eleitoral, Alexandre Espinosa Bravo Barbosa.
Buscavam as agremiações políticas em grau de recurso o reconhecimento do abuso de poder econômico por parte do Senador Sérgio Moro quando da pré-campanha ao Senado nas eleições de 2022, com a consequente cassação do diploma/mandato de Senador e inelegibilidade por 08 anos.
Por unanimidade,o TSE rejeitou os recursos do Partido Liberal (PL) e da Federação Brasil da Esperança (PT, PCdoB e PV) que pediam a cassação/inelegibilidade de Moro e suplentes.
Mas e o que se extrai de lição ou precedente jurídico do julgamento do Senador Sérgio Moro sobre a configuração do abuso de poder econômico na pré-campanha?
A primeira premissa é que o conceito de abuso de poder econômico na pré-campanha deve ser observado de forma associada a outros fatores e não tão somente ao critério de um percentual gastos em relação ao teto de cada candidatura.
Neste sentido disse o vice-procurador eleitoral, Alexandre Espinosa Bravo Barbosa: “Na ausência de regras específicas sobre a pré-campanha,deve-se admitir uma série de critérios – não excludentes entre si– como parâmetros de aferição do abuso de poder econômico na faseantecipada da campanha eleitoral, revelando-se útil: a análise de umpercentual objetivo (10%) de gastos comparados com o teto oficial dacampanha eleitoral; os gastos realizados pelos demais competidores aomesmo cargo; a realidade econômica inerente à circunscrição em disputa; acapacidade financeira dos partidos envolvidos no pleito (caso suportem osgastos de pré-campanha); a natureza dos gastos realizadosantecipadamente; as possibilidades de alcance de um hipotético candidato(ou partido) médio”.
A segunda premissa reside na reafirmação da necessidade da existência extreme de prova robusta a caracterizar o abuso de poder econômico para fins de cassação/inelegibilidade.
Assim disse o relator Ministro Floriano de Azevedo Marques: “Para caracterizar uma conduta fraudulenta ou desvio de finalidade, aptos a atrair a severa sanção de cassação de mandato e de inelegibilidade, é preciso mais que indícios, é preciso haver prova robusta”.
Ainda na seara da necessidade da existência da prova robusta, disse o Presidente do TSE, Alexandre de Moraes:“O tribunal vem sendo extremamente rigoroso em todas as análises, seja indeferindo ou deferindo cassação de registro, cassação de mandato, inelegibilidade, exigindo provas cabais. E aqui não há essas provas”.
Por sua vez o Ministro André Ramos Tavares arrematou:“As gravosas sanções atinentes a inelegibilidade e cassação devem ser aplicadas com parcimônia, demandando sempre a robusta comprovação acerca do abuso de poder, elemento ausente no presente feito”.
A terceira premissa seria que o caso Moro não guardaria relação com o julgamento da ex-senadora Selma Arruda (Podemos-MT) que foi condenada em 2019 pelo TSE por abuso de poder econômico e caixa 2 na pré-campanha e foiusado como precedente pelos acusadores do ex-juiz da Lava Jato.
Isto porquanto no caso de Selma Arruda foram empregados recursos privados e no de Sérgio Moro fundos partidários, a este respeito disse o Presidente do TSE, Alexandre de Moraes:“Esse caso não tem nenhuma semelhança com o caso da Selma Arruda. Se tentou, principalmente na imprensa, colocar semelhanças. Lá, o recebimento foi de recursos privados para a realização de pré-campanha. Recursos privados e não declarados. Nenhuma semelhança”.
A quarta premissa é que não haveria parâmetro seguro, seja na jurisprudência ou doutrinae que a ausência de critério legal objetivo para calcular gastos na pré-campanhae a aplicação de sanções tão graves de perda de mandato/inelegibilidadeacarretaria ao caso em julgamento insegurança jurídica, bem como,para processos futuros julgados pela Justiça Eleitoral.
Assim o disse aMinistra Maria Isabel Galotti: “A disparidade de estimativas feita por cada um dos atores processuais, seja cada um dos autores, seja cada um dos desembargados, o Ministério Público na primeira instância, o Ministério Público aqui, mostra que, realmente, não há critérios legais, nem doutrinários e sequer juriprudenciais a esse caso que é ímpar”.
Findo o julgamento, a unanimidade do resultado, muito mais do que a manutenção da absolvição, causou estranheza principalmente quando a matéria não é pacífica, mas que só o Sobrenatural de Almeida (personagem do magistral Nelson Rodrigues) pode explicar tal fenômeno!
Mas, mais do que a perplexidade da unanimidade, o julgamento de Moro tornou ainda mais imprecisa a matéria do abuso de poder econômico quando da pré-campanha, a necessitar regulação objetiva e criteriosa, fato que o legislador ou o TSE deverá cuidar para as próximas eleições.
Por fim, ficou ainda o recado aparentemente contraditório de que tal julgamento e posicionamento do TSE não se configura em carta branca para todo e qualquer desvio ou abuso político ou econômico quando da pré-campanha, o caso concreto, a origem dos gastos realizados e a existência de prova robusta é quem balizarão a sorte do candidato.
Giancarlo Barbosa é advogado com atuação no Direito Eleitoral e sócio fundador do Escritório Giancarlo Barbosa Advogados Associados SC.